Quarta-feira, 22 de Março de 2006

AMOR, MARCA REGISTADA

 

 

Nem acredito que me tenhas feito tal coisa… De facto, sinto-me enganado por ti. Logo tu, em quem sempre acreditei e depositei toda a minha confiança. E para quê, agora que me abandonas sem apelo nem agravo… E pior, trocas-me por outro como se tudo o que passámos juntos não tivesse qualquer significado para ti. Afinal, quando foi que te tornaste uma cabra mal agradecida? Na verdade, não sei, contudo nem vou tentar saber sob pena de me magoares mais do que já conseguiste. Porém, ficamos por aqui, não terás outra oportunidade de me relegares para segundo plano como quem arruma um objecto obsoleto numa gaveta qualquer. Isso não aceito, preferia acabar num contentor de lixo, do que permanecer esquecido num canto deixado por ti. É engraçado, vê lá tu que por momentos, durante a nossa relação, cheguei a pensar que acendia a chama da tua paixão. Quer por mais absurdo que me pareça agora, julgava ser eu. Vou-te ser franco, até compreenderia que me trocasses por um Dupont, pois tenho que reconhecer que os metais preciosos e a elegância do design satisfazem mais uma mulher do que um mero artefacto de plástico. O que me custa a entender, é porque raio me trocaste por um elemento de inox e que tresanda a gasolina. Ainda para mais, faz tempo que passou de moda, agora não é mais do que um isqueiro de coleccionador. Eu posso ser um simples Cricket mas sempre te fui fiel e nunca te falhei sequer uma vez, salvo quando foste tu a negligenciar-me o gás. Dizias tu e a todos, o quanto achavas que te era útil e de como ficavas aflita sempre que te esquecias onde me tinhas pousado. E eu, feito parvo, ali permanecia quieto, temendo que qualquer uma me pegasse, desejoso que me encontrasses para tomar o meu lugar junto de ti. Por vezes, a vida é feita destes imprevistos e trocaste-me por um Zippo… Podes-me ter partido o coração, mas não esmoreceste o meu lume.

 

 

Lembro-me como se fosse hoje, o momento em que te conheci… Estavas indeciso, pegaste-me e olhaste desconfiado, e só quando me experimentaste ficaste convencido. Desde esse dia, acompanhei-te para todo o lado, nos estudos e nas cartas que escrevias. Será que todos os sentimentos que partilhaste comigo e todos os teus segredos que sempre guardei, não se manifestam em ti como remorsos? Presumo que não, pois se assim o fosse, não estaria tão desapontada contigo. Sabes, pode haver milhares como eu, mas que nutram o que sinto por ti, duvido que existam. Só de pensar em tudo o que fiz por ti e todas as palavras que escreveste comigo, chega-me a dar um aperto no coração… O mesmo que, apesar de ser de plástico, só batia por ti. Devo dizer-te que fui para ti mais que um simples utensílio de escrita, até porque a tua letra sempre foi horrível. Na verdade, se não fosse eu a corrigir alguns dos teus rabiscos, ninguém te teria levado tão a sério e acabarias por te ridicularizar. Mas isso para ti não conta nem dás o devido valor, estás mais preocupado com o que os outros usam ou se fazem pouco de ti por causa da tua Bic. Reconheço que não dou tanto nas vistas como algumas das minhas semelhantes, e sempre me ocorreu que haveria de chegar o dia em que me trocarias por uma Parker. Aliás, eu própria nunca te escondi a minha admiração pelo requinte dos modelos desta marca. Não podia estar mais enganada, não só descuraste a minha opinião, como também me ofendeste ao optares por uma Inoxcrom. Francamente, mas o que tem essa caneta da moda que eu não tenha? O design não é tudo na vida e lá por ser mas vistosa do que eu, em nada ultrapassa a minha qualidade e fidelidade na escrita. Pois fica sabendo que ficaste muito mal servido e que jamais aceito ser relegada num estojo. Não voltas a pôr-me as mãos em cima nem os olhos no meu bico.

 

 

Um abraço...

 

SHAKERMAKER

 

 

honky tonk women por shakermaker às 00:00
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